Entrevista – Alexandra Rocha: «Interpretar e escrever é algo que terei sempre perto do coração»

Após a recente reexibição de Frágil Som do Meu Motor na RTP, o Quinto Canal traz até si uma entrevista exclusiva com Alexandra Rocha, a protagonista do filme.


Com argumento e realização de Leonardo António, Frágil Som do Meu Motor é um thriller que foi gravado no Peso da Régua, Serra da Estrela e Lisboa. Venceu nos Prémios Sophia, na categoria de “Melhor Música”.

A Alexandra é licenciada em Direito, na Universidade de Coimbra. O que a levou a ingressar numa área tão diferente quanto a representação?

A pergunta quase deve ser feita ao contrário… só entrei nessa área depois de ter passado por um ano do curso de Ciências da Comunicação, pelo Direito, pelas Nações Unidas (sessões preparatórias do Internacional Criminal Court), direitos humanos… Representar não era um objetivo consciente na minha vida, foi uma reviravolta e uma surpresa inesperada. Mas porquê o Direito? O que as leis têm de bom é que, como diz o personagem do Tom Hanks no filme Philadelphia, às vezes consegue-se mesmo fazer justiça (algo assim) – aliás, esse filme foi uma referência para mim – e o seu conhecimento dá-nos ferramentas que nos permitem fazer uma diferença no mundo (tal como o cinema, o teatro, a literatura…). Bom, voltei para Lisboa e inscrevi-me num workshop de interpretação para teatro com Rui Luís Brás e não sei o que aconteceu (o Rui tem essa magia) mas quando dei por ela já não conseguia viver sem isso, senti-me em casa. Como consequência, inscrevi-me num curso de três anos de teatro, cinema e televisão que frequentei ao mesmo tempo que fazia o estágio de advocacia. Advogada de dia, atriz à noite. Mais tarde, passei a integrar a direção de uma companhia de teatro (até hoje), direção essa que é como uma família para mim e que, entre outras coisas, serviu de plataforma para artistas emergentes. Esta companhia permitiu-me ir mais além do trabalho de interpretação e adquirir experiência ao nível da produção teatral, encenação e dramaturgia.

Como surgiu a oportunidade de interpretar a “Gabriela” de Frágil Som do Meu Motor?

O Leonardo António já conhecia o meu trabalho de uma outra película intitulada do realizador Bruno Soares, deu-me o guião para ler, perguntou-me a minha opinião, convidou-me e… cá estamos. Foi uma aventura!

A Alexandra é conhecida pelos seus pares como uma atriz que possui skills consideráveis. Como foi a responsabilidade de fazer uma cena de tango ao som de Passión, de Rodrigo Leão?

Foi altamente entusiasmante, mas também uma grande responsabilidade porque estávamos a filmar com a banda a tocar ao vivo.

 

A que se tem dedicado atualmente no espectro profissional?

Há 3 anos conclui, em Madrid, um Master em Criação de Guiões Audiovisuais e desde essa altura, tenho conjugado essa arte com a minha empresa.

Tenho vários projetos em curso entre os quais três séries, um livro (que só será lançado em 2022) um podcast que irei lançar brevemente. Tenho várias solicitações como script doctor que é algo que adoro fazer. Interpretar e escrever é algo que terei sempre perto do coração.

O que mais me assusta nesta nova realidade (guionismo)?

Os eventos de pitching, sem sombra de dúvida. São sempre assustadores (e não há experiência de palco que me valha) por vários motivos: tens de conquistar o produtor ao ponto de querer gastar dinheiro contigo (e quando dizes produtor estás a referir-te a vários, simultaneamente e de empresas muitas vezes distintas) tens de ser rápido, mas ao mesmo tempo tens receio de deixar detalhes importantes por dizer, etc. Mas é muito importante saber fazê-los. Até coro de vergonha quando me lembro do meu primeiro: foi em Madrid, mas com transmissão em streaming para outros países hispano falantes, os nervos. Ainda bem que levei um trailer senão acho que me esquecia da história (risos). Obviamente estou a brincar pois não nos esquecemos das nossas histórias, mas podemos atrapalhar-nos e afetar a nossa apresentação.

Pode dar-nos detalhes sobre a série?

Trata-se uma uma série dramática, baseada em factos reais, do género thriller politico-policial, centrado no período pós ditadura, que conta a historia de uma mulher, a primeira inspetora do país, a qual investiga a verdade por detrás de uma lista com 456 crimes de género que pode pôr em questão a liberdade agora adquirida apenas para se perceber que nada mudou.

Qual foi a sua motivação para escolher esta história em particular?

Como dizia na minha apresentação, “através do passado pretendemos alertar para o presente” e “as leis mudaram mas mentalidades não”.

Uma nota: convém termos noção (pelo menos tem sido assim na minha experiência) que não nos limitamos a guiões e tratamentos e sinopses. Convém saber fazer um cartaz, um dossier de vendas, etc., saber fazer de tudo.

Voltemos à representação. Que desafios deseja abraçar como atriz?

Personagens controversas historicamente sobretudo quando, vivemos na era do que eu gosto de chamar efeito tomahawk: damos uma opinião hoje e minutos seguintes somos fustigados por opiniões contrárias de uma forma devastadora. Seria também uma maneira de viver a vida dessa personagem e talvez mostrar outra versão da sua vida até à data não vista. Neste preciso momento estou a trabalhar num projeto (como co-autora) que me permitiria fazê-lo não fosse o fato de não me imaginar a interpretar personagens criadas por mim (é uma dificuldade minha, já era assim no Teatro).

Quais são as principais vicissitudes que identifica na vida e trabalho dos atores?

Precariedade, precariedade, precariedade.


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Rúben Gomes

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20 Comentários

  • Grande entrevista. Mulher guerreira, que corre atrás dos seus sonhos e não desiste nunca. Na torcida por ti querida.beijinhos

  • Ainda conheço pouco mas adorei a entrevista e dá para ver que e uma profissional brilhante de alto nível e que agora terei o gosto de conhecer melhor desejo a maior sorte do mundo e sempre com muito sucesso beijinhos e sempre a subir😘😘

  • Uma excelente entrevista a uma excelente actriz. Muito boa colega, amiga e óptima nas suas mil facetas. Beijinhos Alexandra. E parabéns pelo filme.

  • Vi o filme no Brasil e gostei imenso, as interpretações sao muito boas. Adorei vê-la, Alexandra. Espero ansiosamente pelo seu podcast.

  • Uma entrevista inspiradora! Onde posso ver os filmes já procurei e não encontro?

  • Gostei bastante da entrevista, directa e sem rodeios. Fica-me o SONHO como esperança e PRECARIEDADE como facto e tristeza! Obrigada Alexandra

  • A Alexandra teve a coragem de sonhar e correr atrás dos sonhos e isso é muito inspirador para os outros na busca da felicidade.

  • Excelente entrevista. Que cercana. Disfruto de la sencillez y la elocuencia.

  • Eu gostei muito da entrevista, e sempre gostei muito do trabalho da Alexandra como profissional, de teatro, e como intérprete.
    Tem um percurso profissional, muito largo e com uma experiência enriquecedora por trás, não só como artista mas também como profissional de direito. Tudo isso, e muito importante para a carreira de um artista, o saber, o já ter vivido muito, e ter diferentes experiências e formação como a Alexandra, que tem investido imenso em formação.
    Gostei muito da entrevista.
    Desejo as maiores felicidades a Alexandra.😊

  • Parabéns pela entrevista! Obrigada por referir um assunto tão importante como é a precariedade. Muito sucesso e a aguardar a novidades.

  • Adorei a entrevista! Bastante interessante onde a mensagem a retirar é de nunca desistirmos dos nossos sonhos.
    Que a Alexandra realize todos os seus objectivos! Ficarei a aguardar para mais novidades!
    Felicidades!

  • Adorei a entrevista! Muito interessante e objectiva. Parabéns!

  • Que agradável surpresa! Conheci a Alexandra num outro contexto bem diferente, já lá vão uns anos, tendo-lhe, entretanto, perdido um tanto o rasto. Na entrevista, agradou-me sobretudo a maturidade, a garra que mostra na forma como agarra as coisas, mantendo a humildade que já lhe sabia ter.
    Não vou voltar a distrair-me do seu percurso! Parabéns.

  • A Alexandra para além de grande actriz é uma notável profissional e um Ser Humano único.
    Este trabalho foi apenas um pedaço do seu enorme talento.
    Desejo os maiores sucessos nestes novos desafios a que se propôs. PARABÉNS pela sua genialidade!

  • Parabéns! Super profissional! Tenho saudades de te ver nos palcos! Grandes beijinhos!

  • Adorei a entrevista! A Alexandra é, acima de tudo, uma grande mulher e cheia de valor e valores! Tudo o que faz é com o coração, mas também com o cérebro – tudo na dose certa.
    No “Frágil Som do Meu Motor” pôde mostrar a todos o seu talento e quem a conhece sabe também que se entregou em pleno.
    Aguardo com muita expectativa os seus próximos passos e sei que serão grandes, importantes e recheados de muito significado no panorama artístico e cultural.

  • What a great interview. And the insights given by Alexandra just goes to show what you initially set out to do might not necessarily be the overall outcome. However taking everything you have learnt along the way and finding a way to fuse these two industries together is an art and skill within itself. Alexandra is a great example of the words “Driven” and “Empowering”.

  • Que maravilha ler esta entrevista! Saudades de ver a Alexandra Rocha; este filme foi muito especial, com um grande elenco, muita dedicação e excelente argumento, que a Alexandra protagonizou com mestria!
    Anseio pelos novos projetos; que não tardem!
    A Alexandra é uma atriz que, além dos projetos “visíveis”, faz muito trabalho de bastidores, que também merecem destaque, como por exemplo, a direção de atores, criação de personagens, acompanhamento no processo de ensaios, etc.
    Muito sucesso!

  • A Alexandra é uma excelente profissional, auguro grandes projectos vindos da sua mente estimulante.
    Desejo-lhe muita sorte na sua carreira profissional, ela merece.

  • Uma entrevista inspiradora. A luta pelos nossos sonhos e por o que gostamos de fazer jamais se cala dentro de nós, ainda que a vida nos tente levar por outros caminhos.
    Prezo que a atriz tenha sucesso nos seus projectos futuros.

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