Duas décadas de televisão portuguesa. 2021, e agora?

Fecham-se hoje duas décadas que muito marcaram a televisão portuguesa. Há precisamente 20 anos Zé Maria preparava-se para se sagrar vencedor do reality-show que mudou a “caixinha mágica”, o Big Brother. Ainda se lembra?


Durante vários anos a SIC deteve o título de estação mais vista pelos portugueses, depois de outros tantos marcados pelo monopólio da RTP. O terceiro canal mexeu com o mercado televisivo, batendo recordes sucessivos de audiências. No plano oposto esteve a TVI que, desde a sua fundação, demonstrou várias fragilidades. No entanto, com a mão de José Eduardo Moniz, conseguiu impôr-se frente a um canal que se mostrava implacável.

Nessa altura não existia a força da Internet, influenciadores digitais nem era possível voltar atrás na box quando não tínhamos visto um programa. Havia o desconhecido.

Big Brother e a ficção

 

Teresa Guilherme, apresentadora do Big Brother, durante a gravação do programa , 14 de Novembro de 2000, no estudios da Endemol na Venda do Pinheiro. Foto GUSTAVO BOM

A aposta da TVI no Big Brother, em Teresa Guilherme e na ficção, levou a estação a um crescimento sustentado nas audiências. Ainda que as manhãs e as tardes tivessem demorado mais tempo a serem conquistadas, a SIC foi-se perdendo entre apostas fracassadas e direções de programas à deriva.

Se no antigo canal da Media Capital ecoava a pergunta Quem Matou o António? (Ninguém Como Tu), na primeira estação privada portuguesa inventava-se um incêndio num reality-show cujo objetivo seria encontrar o melhor homem disfarçado de mulher. Sim, estamos a falar do Senhora Dona Lady, na altura apresentado por Herman José e Sílvia Alberto.

Durante vários anos Fátima Lopes foi a âncora da SIC. Apesar das quedas em todos os horários e da perda de popularidade das novelas brasileiras (que ocuparam grande parte da grelha do canal até ao final de 2010), o horário matutino foi dos poucos que deu estabilidade à antena da estação. Até que, em 2010, Fátima Lopes decide mudar-se para a TVI e os talk-shows da SIC passam ainda a ter mais dificuldade em impôr-se.

O sucesso Morangos com Açúcar

Morangos com Açúcar

Não esquecer igualmente o fenómeno Morangos com Açúcar que, em 2005, acompanhou a vida de miúdos e graúdos. Quem se lembra do Colégio da Barra? Costumo dizer que: “em televisão nada se cria, tudo se transforma”. Foi assim que a TVI criou um sucesso muito semelhante ao de Malhação e New Wave.

A SIC voltou a tentar a mesma jogada com Floribella, graças a Teresa Guilherme. Foi assim a primeira vez que a ficção portuguesa no terceiro canal ganhou força, também motivada pela aposta em Vingança. Seguiram-se outros “tiros ao lado”, como Chiquititas, Rebelde Way ou Lua Vermelha.

Os concursos da RTP

Destaquei até agora a SIC e TVI mas foi a RTP1 que, em 2006, fez uma aposta certeira nas noites de sábado. Catarina Furtado e Sílvia Alberto foram os rostos escolhidos para conduzir as várias edições do Dança Comigo e Dança Comigo no Gelo. Deste programa ficou também a boa prestação de João Baião e Rita Blanco no papel de jurados.

Apesar da constante vitória da TVI no universo da ficção, a SIC passou a atingir resultados mais consistentes com Laços de Sangue, Dancin’ Days ou Sol de Inverno. Foi também a partir deste momento que o quarto canal começou a ter dificuldades no seu horário nobre.

Neste campo, a estação pública sempre se pautou por oferecer concursos de cultura geral aos telespetadores. O Elo Mais Fraco, Um Contra Todos, Quem Quer Ser Milionário ou Herança foram alguns destes exemplos. Isto, sem descurar uma liderança nunca antes vista num dos horários mais importantes da televisão: o das 19h. Assim, e desde 2002, Fernando Mendes e o seu Preço Certo continuam a somar vitórias e “minutos mais vistos do dia”.

A nova SIC

Daniel Oliveira audiências SIC

Fazendo uma retrospetiva se, até 2016, a TVI era líder destacada nas áreas da ficção, reality-shows e talk-shows (com Cristina Ferreira, Manuel Luis Goucha e Fátima Lopes ao serviço), a SIC ganhava pontos nas tardes de cinema, na comédia, com os Gato Fedorento, na Informação, com as reportagens e Nós Por Cá e, igualmente, em programas para a família. Falo-lhe, por exemplo, do Vale Tudo.

Assim, a promoção de Daniel Oliveira a Diretor de Programas da SIC deu à estação uma força não vista há muitos anos. César Mourão passou a ser uma das figuras-chave do canal. A aposta em Casados à Primeira Vista foi certeira. Na ficção, Nazaré garantiu a liderança no horário nobre da SIC. Claro, não esquecer que a isto se somou a mudança de Cristina Ferreira da TVI para o terceiro canal.

Cristina Ferreira

Sem que nada o fizesse esperar, a estação de Queluz de Baixo não conseguiu evitar o declínio nas audiências. Foi visível a falta de estratégia nos mais variados horários. A TVI quis passar a imagem de que havia vida sem Cristina Ferreira, mas não conseguiu fazer um trabalho de casa consistente. Um exemplo disto foi o Dança com as Estrelas, Começar do Zero, Like Me ou First Dates.

Nas manhãs, O Programa da Cristina atingiu níveis de audiência históricos. Na sua estreia registou 6,9% de audiência média e 40,6% de quota de mercado. À tarde também Júlia Pinheiro passou para a liderança, destronando o A Tarde É Sua.

Tão depressa entrou na estação de Paço de Arcos, como saiu. Assim, e em julho deste ano, Cristina Ferreira decidiu regressar à TVI para dar ao canal a hegemonia de outrora. Com ela trouxe várias ideias, algumas que resultaram melhor do que outras. Recrutou antigas caras do canal (“A TVI tem memória”), lançou o Dia de Cristina sempre que a própria o quisesse e voltou a colocar Teresa Guilherme na linha da frente.

2021

Os resultados ainda suscitam algumas dúvidas. A TVI aproximou-se da SIC, mas continua com algumas fragilidades, nomeadamente quando não existem especiais, ou quando Cristina Ferreira não está em antena. 2021 promete dizer-nos qual o canal que levará a melhor nas audiências. Será que Daniel Oliveira vai ter uma estratégia consistente face às investidas da TVI? E a RTP1, que linha seguirá para continuar a ser vista pelos portugueses? Depois de ter entrado na competição de domingo com Hoje É Domingo!, terá o primeiro canal pensadas outras investidas? Na ficção, de certeza que dará cartas.

2021 começa por trazer-nos na TVI a estreia de Dois às Dez, Goucha e All Together Now. Na SIC iremos ter mais ficção, Máscara e a versão portuguesa de Hell’s Kitchen. Já na RTP1, Fernando Mendes promete continuar a dar luta nas audiências. De salientar também o The Voice, que foi novamente chamado para as noites de domingo com a versão Kids.

Por fim, resta mencionar que, ao contrário de 2000, 2021 já conta com uma força inigualável da Internet, influenciadores digitais na televisão e plataformas de streaming das próprias generalistas a darem cartas (RTP Play, OPTO e TVI Player).


Seja qual for o canal a levar a melhor, que não se esqueça do mais importante: surpreender os telespetadores.

2021 começa amanhã. Vemo-nos aqui, no Quinto-Canal, e lá, neste novo ano.

Boas entradas e viva a televisão!

Diogo Santos

Licenciado em Ciências da Comunicação e mestre em Marketing e Publicidade. Tenho uma grave obsessão por audiências desde os meus 14 anos. Espanta-se quem me ouve dizer que praticamente não vejo televisão. No entanto, basta fazerem-me uma pergunta sobre esta categoria, e a resposta surge em segundos. Querem testar? ;)

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