Opinião: Quando um beijo causa mais escândalo que toda a violência de uma série

Esta semana duas séries estiveram em destaque no panorama televisivo por terem criado alguma controvérsia entre os seus fãs. A razão da discórdia em ambos os casos é um simples beijo (possíveis spoilers).

Começo por falar de The Walking Dead, série de sucesso mundial e que aborda a capacidade da sobrevivência humana, perante não só os Walkers mas de outros humanos. No episódio desta semana, os sobreviventes ficaram a conhecer um misterioso homem chamado Aaron e após o desenvolvimento do episódio (não vou colocar muitos spoilers) ficámos a saber que Aaron é homossexual e que tem uma relação com Eric. E mais do que saber isso, existe um beijo entre os dois nesse mesmo episódio. E porque é que esta cena é controversa, perguntam vocês. Não é ou pelo menos não deveria de ser. A verdade é que muitos fãs ficaram chocados com a cena em questão e na internet surgiram os típicos comentários de que não irão mais ver a série. Ora bem, uma série que tem sangue, cenas nojentas e mortes ao virar da esquina não pode ter um beijo? Não vi ninguém a reclamar quando o Glenn e a Maggie tiveram o seu momento íntimo, então o que tem de especial este beijo? Será que o público continua assim tão conservador que continua a preferir cenas de pancadaria a beijos?

the walking dead aaron eric

A outra série em questão foi The 100, cujo episódio desta semana apresentou um beijo homossexual entre Clarke e Lexa. Muitos fãs queixaram-se de que o beijo foi totalmente despropositado e que não fazia sentido na história apresentada ou até mesmo que Clarke não era homossexual. Vi comentários de mães indignadas por verem as séries com os seus filhos menores e serem obrigadas a lhes explicarem porque duas raparigas se estão a beijar. Então e as cenas de tortura e violência na série também não causam controvérsia? Neste mesmo episódio houve uma cena de sexo entre duas personagens heterossexuais. Imagino o trabalho que estas mães devem ter tido a explicar porque aquilo estava a acontecer.

A questão com The 100 é que Clarke é a protagonista da série (o que criou um enorme festim na internet pois é talvez a primeira protagonista de uma série do The CW a não ser heterossexual) e a verdade é que a sua sexualidade nunca foi questionada ou nunca teve relevo para a história. Contudo, devido aos desenvolvimentos da história (novamente a evitar spoilers), qualquer pessoa que assista a série percebeu todos os sinais dados relativamente à relação entre estas duas personagens. E apesar de o criador da série já ter explicado que no contexto da história da série não há qualquer importância em relação à sexualidade de todas as personagens, muitos fãs mostraram-se indignados com um beijo.

the 100 3

A minha questão em relação aos eventos destas duas séries é se não será tudo uma campanha para angariar audiências. The Walking Dead não precisa disso obviamente e The 100 tem uma presença muito forte na programação do canal, pelo que não creio que seja uma campanha de marketing. A verdade é que existe um aumento da representação da comunidade LGBT em séries televisivas americanas e sendo ou não uma forma de obter audiências, é importante que exista essa representação. Agora podemos ser todos adultos e apreciar uma série no seu todo independentemente da sexualidade das suas personagens?

Nota: Estes eventos sucederam-se a dois outros também importantes. Primeiro, em Black Sails foram finalmente revelados os motivos que incentivam as ações do protagonista Captain Flint e ficámos a par da sua relação homossexual (e novamente os fãs ameaçaram que vão deixar de ver a série). Depois, assistimos em Glee ao casamento de dois casais homossexuais, o que acho que nunca aconteceu na televisão americana.

Inês Calhias

Licenciada em Ciências da Comunicação pela Escola Superior de Educação e Comunicação da Universidade do Algarve, desde cedo adquiri um enorme interesse por séries. Tento ver um pouco de tudo e apresentar aqui no Quinto Canal o que se passa no panorama televisivo.

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